terça-feira, 28 de setembro de 2010

Quem disse que o Brasil não tinha seu Al Capone?

Hoje, assistindo à gravação da sessão plenária extraordinária de ontem do STF, senti a alma lavada como cidadã. A sessão do julgamento do deputado federal Tatico, um cara-de-pau, como há muito eu não via, mostrou claramente que pelo menos a nossa Corte Máxima não está no mesmo nível do legislativo. Ao contrário, vocês verão mais abaixo no texto, porque a sessão foi convocada rapidamente e julgou o processo com a agilidade merecida por este caso patético.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal condenaram, na sessão extraordinária de ontem (27/09), a 7 anos de prisão em regime semi-aberto e 60 dias-multa, o deputado federal José Fuscaldi Cesílio, mais conhecido como José Tatico, do PTB-GO, pela prática dos crimes de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária. Por unanimidade de votos, foi acolhida a Ação Penal (AP 516), na qual o Ministério Público Federal denunciou o político com base em ação fiscal realizada na empresa Curtume Progresso Indústria e Comércio Ltda. A filha de Tatico, Edna Márcia Cesílio, sócia no curtume, foi absolvida por não haver como atribuir a ela qualquer responsabilidade pelos fatos narrados na denúncia.
Mas a pergunta aqui é, por que em sessão extraordinária? Ora, meus caros, observem o detalhe deste motivo. O julgamento ocorreu em sessão extraordinária convocada para ontem (27/09), um dia antes de o deputado completar 70 anos de idade, quando o prazo de prescrição do crime reduziria pela metade, o que poderia inviabilizar a condenação. O máximo, não?! Não sei se é para rir ou para chorar dessa situação.
A defesa de Tatico alegou que ele nunca exerceu qualquer ato de gerência ou administração no curtume pelo fato de ter outorgado, em 1983, procuração em favor do filho, conferindo-lhe plenos poderes para administrar a empresa. Em plenário, porém, os ministros não se convenceram com o argumento e, por unanimidade, condenaram o deputado federal, que deverá perder o mandato tão logo o acórdão do julgamento de ontem seja publicado. Os advogados de Tatico podem apenas entrar com os recursos conhecidos como embargos de declaração, cuja finalidade é solucionar algum tipo de contradição, omissão ou obscuridade ocorridas durante o julgamento. Tatico deverá cumprir a pena quando o caso transitar em julgado, depois do julgamento dos possíveis embargos. Quando isso ocorrer, ele perderá seus direitos políticos até que cumpra toda a pena. Ou seja, dentro de 7 anos o impoluto Sr. Tatico “rides again”. Algúem tem alguma dúvida?
No ano passado, Tatico alterou seu domicílio eleitoral para Minas Gerais, onde está em campanha novamente para o cargo de deputado federal. O parlamentar também já exerceu mandato na Câmara dos Deputados pelo Distrito Federal. Um perfeito viajante do mundo eleitoral, não?! Além da pena de 7 anos de prisão, os ministros condenaram Tatico ao pagamento de multa de R$ 6 mil. "Ficou inequivocamente estabelecido nos autos que ele fazia o desconto e não os repassava à Previdência Social. Ele sonegou remunerações pagas aos funcionários", afirmou o procurador-geral da República, Roberto Gurgel.
José Tatico é novamente candidato a deputado federal, desta vez por Minas Gerais. O TRE do Estado já indeferiu sua candidatura, mas ele ainda aguarda o julgamento de um recurso no TSE. Enquanto isso, ele pode fazer campanha, apesar do julgamento no STF. O deputado é dono de supermercados populares no entorno de Brasília. Tatico ainda responde a outra ação penal no STF, que não foi julgada. Trata-se de acusação por furto de carga. Cara-de-pau é elogio para essa criatura!


O ex-deputado federal José Fuscaldi Cesílio, o Tatico.

Materialidade dos delitos
O relator, ministro Carlos Ayres Britto, anotou a pena máxima cominada aos delitos imputados ao parlamentar de 5 anos de reclusão para ambos os crimes. Em seguida, ele entendeu estar configurada a materialidade dos dois delitos imputados ao parlamentar. Ele observou que há extensa documentação que detalha a prática dos crimes de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária. O relator demonstrou que o INSS teve o cuidado de fazer uma demonstração detalhada dos fatos geradores da sonegação da contribuição previdenciária "e com precisa indicação de cada uma das notificações de lançamento de débito".


Ministro Ayres Britto, o Relator

Indícios de autoria
Para o ministro, há indícios suficientes de autoria. Tatico seria sócio-gerente da empresa desde a época em que foi constituída, em 1993, até o momento, situação que permanece, apesar de, atualmente, a empresa estar desativada. Assim, ele teria responsabilidade penal em relação à Curtume Progresso Indústria e Comércio Ltda. e, portanto, sobre os fatos apurados. O voto do ministro relator foi acompanhado, na íntegra, pelo ministro revisor da ação penal, Joaquim Barbosa. Segundo ele, o argumento da defesa de que Tatico nunca exerceu qualquer ato de gerência ou administração no curtume pelo fato de ter outorgado, em 1983, procuração em favor do filho, conferindo-lhe plenos poderes para administrar a empresa, não se sustenta. "Conforme ressaltou o Ministério Público, apesar da outorga de poderes de gerência do curtume ao filho Edmilson José Cesílio, o réu não se viu privado de tais poderes, tal como demonstrado aqui pelo ministro relator, o que autoriza a conclusão de que ele também era responsável pelos atos de gestão", disse Joaquim Barbosa.


Joaquim Barbosa, Ministro revisor da ação penal
Ao votar pela condenação de Tatico, o ministro Toffoli afirmou que a defesa também não conseguiu comprovar que o débito previdenciário é objeto de parcelamento junto à Previdência Social. "Aliás, essa demora em fazer uso do dispositivo de parcelamento indica que a defesa apostou numa eventual prescrição para se furtar do pagamento da dívida. A legislação brasileira usou do dispositivo da penalização como um instrumento para obrigar o pagamento do débito fiscal, dando o prazo máximo para a extinção da punibilidade, mas parece que, no caso em questão, a única maneira de se lograr que a Previdência Social receba esses valores é a condenação", disse o ministro. A ministra Cármen Lúcia acompanhou o relator, afirmando não haver dúvidas tanto em relação à autoria do crime, quanto a todos os comportamentos penalmente imputados a Tatico e devidamente comprovados. Os ministros Gilmar Mendes e Ellen Gracie também acompanharam o relator, assim como o ministro Marco Aurélio. Para ele, as alegações da defesa não subsistem. "No caso em questão, o deputado tinha a gerência da pessoa jurídica, o que atrai a responsabilidade subjetiva. Já o parcelamento teria sido obtido em 2009, mas só em julho último foi recolhida a primeira parcela. Logicamente, tem-se aqui o inadimplemento. Não há nada após o recolhimento tardio da primeira parcela que indique a subsistência do parcelamento", concluiu Marco Aurélio.
Relator do processo, o ministro Ayres Britto avisou que o resultado do julgamento será comunicado à Justiça Eleitoral, que poderá ainda incluí-lo como ficha suja.




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